quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Plural eu, singular nós


Ainda lembro do dia em que te vi pela primeira vez e nesse dia eu já sabia que a paixão platônica seria inevitável. É difícil ver alguém do sexo oposto lendo e não me apaixonar - e aquele livro em suas mãos era um adorno tão lindo. Eu não tinha dúvidas: ler realçava a beleza das pessoas. 
E não importava se eu ia conversar com você um dia, se um dia eu ouviria a sua voz ou saberia o seu nome, eu gostava mesmo era de idealizar você nas minhas melhores imaginações. Gostava de imaginar sua voz, que eu nunca tinha ouvido, lendo os trechos dos meus livros favoritos para mim. Gostava de imaginar sua mão entrelaçada a minha e a gente sorrindo um para o outro. Gostava de imaginar qualquer coisa com você. Eu nunca coube no plural, sempre fui adepta do singular, mas você me fez acreditar que era possível um sujeito composto conjugar o verbo amar. Sem eu perceber você já era o meu enredo, meu clímax e a cada capítulo dos meus sonhos eu rezava para que você não fosse o meu fim.
Eu já tinha escrito muitos capítulos da nossa história quando ouvi sua voz pela primeira vez e naquele momento eu sabia que teria que editar cada trecho que eu já havia escrito, porque sua voz era ainda mais linda do que nas minhas imaginações. Sua voz passou a ser a minha melodia favorita e essa melodia sempre fez meu coração dançar, mas infelizmente o meu coração dançava sozinho na falta de um par.
Seu coração sempre foi um tanto misterioso e nunca quis ter um dedo de prosa com o meu, então meu coração conversava sozinho, cantava e dançava a fim de chamar sua atenção, mas o pobrezinho nunca conseguiu.
Dizem que só atraímos aquilo que somos e talvez esse fosse o preço que eu tinha que pagar por ser apaixonada por romances complexos em que as coisas só dão certo no penúltimo capítulo e no último a protagonista morre. Meu romance sempre seria um verdadeiro drama.
Eu sempre soube que era perigoso trazer o abstrato para a realidade, é extremamente não recomendado concretizar nossas idealizações, mas era tarde para ouvir a razão. Eu já tinha conversado com você, já tinha ouvido sua voz e sabia o seu nome. Eu sabia quem você era mesmo sem saber nada sobre você, e o que era platônico passou a ser real. Mesmo sem eu querer a mutação aconteceu e a paixão virou amor. 
Eu passei a idealizar em palavras esse sentimento também, mas a realidade já era uma intrusa assídua nas minhas poesias e esse amor eu só conseguia rimar com dor. A reciprocidade estava ausente, querer ser plural não era poder. Talvez eu tenha nascido para ser singular e mudar seria incoerente. Ainda assim tentei fazer parte da sua história, mas não era boa o suficiente para nenhum papel. Tornei-me mera figurante. E foi nessas indagações sobre o porquê de te amar, foi nessa de escrever pra não chorar que descobri o que realmente significava o que eu sentia. Aprendi que amor não é aquilo que te completa. Amor é aquilo que te destrói e faz você descobrir que ser pedaços é o melhor jeito de viver.
Embora fosse difícil te ver todos os dias e fingir que esse sentimento não existia, eu não desisti de te amar. Passei a amar em silêncio. Escrever em segredo. Já não publicava meus textos porque o amor que sentia por você era sincero e transparente demais para ser camuflado em palavras cujos significados são indiretos. E era nas entrelinhas que eu despejava tudo o que sentia. Por detrás de cada palavra eu escondia os meus sentimentos. Mas a verdade é que eu já não queria esconder mais nada. 
A história que escrevi pra gente estava monótona demais e entediaria qualquer leitor. Eu queria gritar pro mundo inteiro ouvir o quanto eu amo você e não importava se fossem me chamar de louca, eu nunca tive medo de ouvir a verdade e a verdade é que sou completamente louca por você, mas o cansaço das batalhas verbais sempre me impediu de mudar o rumo do desfecho.
Pausei a escrita da nossa história, porque eu estava sempre diante de um travessão, mas você já não tinha mais nenhuma fala. Você ficou escondido atrás daquela vírgula, porque nunca quis se explicar. Você sempre fora um mistério calado e nunca permitiu que ninguém tentasse te desvendar.
De narradora personagem, passei a ser observadora, mas infelizmente não serei onisciente. Você não me permite saber o que pensa e muito menos o que sente.
O livro está aberto cheio de reticências pra quando você quiser protagonizar, mas guardei-o na estante, porque já não consigo mais ter criatividade e continuar.
Tentei matar tudo o que sinto, mas sou romancista e não serial-killer. Tentei desvendar seus mistérios, mas não sou a Agatha Christie. Então resolvi deixar o amor vivo aqui dentro de mim, simplesmente porque ainda não aprendi a usar o ponto final para escrever o nosso fim.

                                                      - Betina Pilch.