quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Despertar – Por Betina Pilch

Foi numa daquelas manhãs nada propícias à vida que eu acordei. Mas não foi um acordar de abrir os olhos, foi um acordar de abrir a alma e enxergar o mundo que, durante tanto tempo, eu ocultei.
Acho que todo mundo, vez ou outra, se perde nesse labirinto que é a vida. Mas ao acordar eu percebi que cabia só a mim escolher se queria ficar parada, perdida, ou continuar caminhando até encontrar a saída. Então eu resolvi levantar, caminhar, viver... Porque ficar inerte nada mais é do que uma maneira de enterrar os caminhos que nos são dados para não sermos obrigados a caminhar por eles - e eu estava completamente disposta a desenterrar e conhecer esses caminhos dessa vez.
Coloquei aquela música em inglês que eu nunca li a tradução, porque o importante era que eu gostava da batida, e ri ao perceber que algumas coisas não precisam ser descobertas completamente para serem apreciadas. A música não estava em sincronia comigo, ela tinha uma batida alegre, porém pausada, e meu coração estava completamente acelerado e eufórico. Não, a música não tinha nada a ver comigo, ainda bem. Porque quando uma música veste bem em alguém quer dizer que a vida não está muito fácil. Então eu resolvi descomplicar tudo e comecei a cantar a tal música de um jeito totalmente errado e ri do meu inglês fajuto inventado. Comecei a pular e desafinar e melodiar a vida que estava silenciosa há dias, abri a porta do meu quarto e saí saltitando pelo corredor. Parei diante da porta da cozinha e com um andar totalmente confiante caminhei até a garagem e, por fim, até o portão. 
A manhã estava cinza e fria, dessas que sussurram pedindo para ficarmos na cama até o sol resolver dar sinal de vida. Mas eu calei a manhã, abracei os sinais de morte cinza e gritei que iria colorir o mundo com a aquarela que descobri dentro de mim. 
Saí rindo totalmente sem rumo e pouco me importando com isso - porque ficar sem direção quando estamos presos é horrível, mas ficar sem direção quando somos livres é a melhor sensação. 
A vida é feitas de escolhas. Alguns escolhem viver, outros morrer ou apenas sobreviver. Eu escolhi viver, porque finalmente enxerguei que a vida é viva - de tanto me prender nas estrelinhas esqueci de perceber o óbvio. Descobri que cobrir a vida com detalhes mórbidos é um ato de covardia, porque morrer é tão fácil, mas viver, ah! Viver sim exige de nós muita coragem.
Caminhamos nesse meio-fio-do-mundo-nosso, entre linhas tênues bambas que nos fazem temer e tremer, mas percebi que olhar para o chão não é a melhor visão a se encarar. Há uma imensidão acima de mim e finalmente descobri que posso alcançá-la - basta eu abrir minhas asas e libertar meus pés dos grilhões que eu mesma criei.
Então saí por aí, por ali, acolá, cá e me perdi na minha própria liberdade. E não estou preocupada, porque agora sou livre para encontrar muitas saídas, entradas, janelas abertas, portas trancadas, e abraçar a vida que eu tanto ignorei.