domingo, 7 de fevereiro de 2016

Era uma vez, não é mais – Por Betina Pilch



Era uma vez, assim, no passado mesmo, bem clichê. Porque apesar do felizes para sempre na última página dos contos de fadas, nenhuma felicidade é presente eternamente e - às vezes - mal chega ao futuro.
Abra a página final. Perceba, "viveram". Isso quer dizer que não vivem mais. Passou. Acabou. Assim como todas as histórias de amor - que muitas vezes não se permitem nem ser estórias.
E que bom que as páginas viram e nós caminhamos. Todos os contos de fadas são tão angustiantes. O príncipe tem que salvar a princesa. E coitado desse cara que tem que dar conta da salvação. Tem que ter ação. Ser são. E pra que tanta sanidade?

Fada do céu! Você e todo mundo que me conhece sabe o quanto eu lutei, esperneei e fiz birra com a minha sina. Eu sou teimosa, tinhosa, orgulhosa e não queria uma história qualquer pra mim. Meu castelo sofria cada atentado que só os deuses sabem, mas eu nunca me prostrei diante dos destroços, sempre reergui e reconstruí tudo novamente.

É difícil não conseguir desistir. Existir. Ir.

Mas em meio a solidão de um castelo de sonhos distante da realidade, apareceu ele. Não, nada disso. Sem cavalo branco, espada ou bainha. Só ele, capaz de fazer rir. Ele - aconchego em meio ao caos. Ele - o próprio caos. Ele - solidão, ironia, pessimismo, vazio. Ele, porto seguro. Ele, alto mar.
Se apresentou como Bobo. Me chamou de Dama. Loucura. Cura. Socorro! Quem sou eu? Quem é você? Dúvidas. Vidas. Idas. E ele se escondeu. 
Cadê você? Procurei. Não achei. Chorei. Orei. Ó, rei! Por que? Volta aqui! E ele voltou. Me girou. E pelo amor dos deuses, moço! Para de me revirar. Virar. Irar. 
Prometeu de dedinho nunca mais me abandonar. 
Baita correria. E a gente ria. Até que quando olhei, o sorrir virou só ir. E ele foi indo, até não ser mais quem era.

Entre uma cambalhota e outra que demos de mãos dadas eu percebi que ele só queria brincar. E eu não queria cirandar. Talvez só andar. Não sei. Estava cansada demais. Ai.
Ele ficou, mas me partiu quando desistiu e nem sequer me comunicou que o nosso amor acabou antes mesmo de começar. Me esqueceu. Enlouqueceu. E sua loucura começou a machucar ao invés de curar. 
Cansei. Eu sei, já disse isso outra vez. Mas meu bem, veja bem, você que não soube permanecer. Nem ser. 

Era uma vez. Não é mais. Vivemos felizes. O para sempre ficou lá atrás. Talvez não tenhamos sorte nessa vida. Quem sabe tenhamos na morte. 
Mas é bom segurar a mão de alguém bem forte, porque essa Dama aqui cansou de ver como príncipe encantado quem só se prestava a ser bobo da corte.






E assim me despedi e fechei o livro - sem avisá-lo que era o 

FIM.

                                                                                                                                         

Um comentário:

Unknown disse...

Piraquara, 22 de junho de 2021.
Querida Betina Pilch,
Gostaria de parabenizá-la pelo seu texto. Suas palavras me tocaram, pois me mostrou que a vida não precisa ser um conto de fadas. Que nem sempre a felicidade estará do nosso lado, mas mesmo assim, devemos erguer a cabeça e continuar a nossa caminhada.
Atenciosamente,
Kayke da Silva Rodrigues