sexta-feira, 21 de março de 2014

Estação instável – Por Betina Pilch

Então acordei naquela primeira manhã de outono e sorri um sorriso triste. Senti uma tristeza que sorria. Uma felicidade deprimida. Uma depressão eufórica. Uma euforia mórbida. Uma morbidez vívida.
Fechei os olhos, enchi meus pulmões de ar e dentro de mim, então, só existia aquele oxigênio inspirado. 
Vasculhei minha caixinha de sonhos e percebi que eles estavam secos como as folhas das árvores que caíam. Talvez fosse culpa da estação ou talvez tenha sido culpa desse meu coração asmático e árido. Não sei. Na verdade o não saber era só o que restava em minha mente.
Uma lágrima escorreu da minha alma e meu coração gemeu. Meu ser então suspirou e pro céu olhou. As nuvens escuras estavam chorando comigo e nesse momento derramaram uma gota de tinta cinza em meus olhos, desde então eu só enxergava um mundo acinzentado.
Curitiba era cinza. São Paulo era cinza. A Suíça era cinza. Até o Rio de Janeiro, de repente, acinzentou. E os amores já não tinham nenhuma cor. Aquela pequena gota de tinta fez da minha vida um imenso degradê de cinza. 
O (arpoa)dor agora tinha a ver com a dor de um passado distante que jamais seria presente novamente.
Aquela música do Passenger já não me levava a sonho nenhum, mas era como aquele desperta-dor que me acordava justo quando eu não queria viver. 
Curitiba estava mais cinza do que o normal e estava tão torturante quanto seus ônibus às 6h da manhã. 
São Paulo continuava distante, mas agora já não existia esperança de aproximação.
E meu coração, que já transbordou e bordou o amor, apenas esvaziava um nada que matava e bordava uma dor que apagava qualquer cor que quisesse aparecer. 
Olhei para frente e em meio ao cinza e sépia do outono um vento soprou bem perto de mim. Soprou e sussurrou que assim como ele o outono também iria embora. Que viria mais uma estação para esfriar os ferimentos ardentes do meu coração e depois dela viria aquela que todos chamam de Primavera. 
A amante das cores, das flores, dos amores traria o sol do Arpoador novamente. A melodia apaixonante da música do Passenger. Traria vida para Curitiba. Ressuscitaria os sonhos paulistas. 
Então diante dessa pequena esperança eu pisquei. Aquela tinta cinza ainda estava encalacrada no meu olhar, mas lembrei que meu sorriso ainda era branco e de repente sorri, porque eu sabia que a Primavera viria e coloriria tudo de novo.
Mas no momento só o que me restava era a lembrança dessas memórias mórbidas que pouco a pouco evaporavam. E só a solidão é presença enquanto os sonhos se ausentam e ficam longe de mim.
                                                                                                         

segunda-feira, 17 de março de 2014

Vultos ocultos dentro de mim – Por Betina Pilch


A música toca e inevitavelmente você vem em minha mente com aquele seu jeito evolvente e perversamente inocente.
Fecho meus olhos e te encontro sem hora marcada, sem data estipulada nem nada, porque você sempre gostou de chegar sem avisar. E de repente já é tarde demais pra guiar meu pensar, meu coração dilata e quase me mata por querer sair do meu peito e beijar cada pulsar que salta de dentro de você.
A gente fala de lágrimas com um riso sarcástico no rosto e a contragosto assumimos que nos parecemos mais do que deveríamos nos parecer. 
Você me abraça, me enlaça e no espaço de seus braços tudo que era pedaço torna-se inteiro.
Enlouqueço e quase me esqueço que nossa proximidade está cercada de impossibilidades e que nesse momento em meu peito você não passa de um forasteiro passageiro que só chegou para me bagunçar e despertar uns desses sentimentos que não nascem pra vingar.
Permaneço colada em teu corpo e sofro por não poder permanecer assim. A gente se demora, mas sei que a qualquer hora você vai embora e eu degustarei o fim.
Silenciamos diante do nosso desânimo e ficamos parados escutando nossa respiração acelerar. Sabemos que não nascemos pra felicidade, somos cheios de complexidade, que tudo que passa é brisa leve e não vento forte capaz de nos fazer voar.
Meus pés pesam no chão e no meu coração sinto uma voz gritar dizendo que não quer te largar e pedindo pra você me a(ni)mar.
Você me a(ni)ma e me mima, fala que sou sua menina e promete que nunca vai me deixar. Eu calo sua boca com um beijo, digo que promessas costumam falhar. Salgo minha face com lágrimas e de repente meus olhos começam se abrir. Retorno a realidade e mesmo sem querer me obrigo a te ver partir.
                                                                                                          

sábado, 15 de março de 2014

Me mate, só não acabe com a minha vida – Por Betina Pilch


Eu não sei o que está acontecendo comigo, até porque nunca me entendi. Quem me explicava era sempre você. No entanto, nesse momento, me explicar seria explicar você mesmo e nesse caso quem sempre te entendeu fui eu. 
Percebo que quanto mais me des-vendo, mais te encontro. E me revelando descubro que os segredos eram apenas alguns embaraços causados por nós que eu atei sem você saber.
(Trans)bordo palavras e me afogo em sentimentos (bor)dados pra você. Então te sufoco com o meu sentimentalismo e foco onde está tudo desfocado. Você tosse e se engasga enquanto bebe minhas loucuras a goles sôfregos tentando respirar sem pirar diante de tanta (ins)piração sem nexo. 
Sua loucura sempre se pareceu com a minha, mas talvez eu tenha ultrapassado os limites e não nos parecemos mais. Talvez minha loucura já não seja agradável ao seu paladar. Talvez eu lhe cause náuseas. Talvez você vomite. Talvez você queira me amar(rar) em uma camisa de força enquanto lhe peço encarecidamente que seja o meu psiquiatra. "Não fuja de mim diante da minha loucura!" - grito enquanto você me observa. Eu rio diante de tanta insanidade e pareço ainda mais louca. Então você ri também. É, a gente sorri. Só ri. Porque o que nos resta é isso: só (r)ir. 
Peço que me entenda, não me deixe e me ignore o máximo de vezes possível também. Não faço sentido, vivo sentindo e grito insistindo pra que me mande calar a boca e voltar ao normal. Calo a boca e percebo que normal eu nunca fui. Então continuo sendo louca. Louca por você. 
Você não entende nada e pensa: "Não sei lidar. Não sei lhe dar." e, lendo seus pensamentos, eu respondo: "Não lide, não ligue, não me dê nada."
Porque o que (não) temos me basta e é pelo que (não) temos que morro de amor. Só não fuja de mim, mesmo que eu mesma fuja de mim às vezes.
Uma vida morrendo é uma vida. Uma vida sem morte, é apenas uma morte camuflada. Prefiro morrer de amor do que viver sem amar - então espero que você continue me (m)atando.